Nichos de Mercado: como grandes marcas criam novos impérios

Por Milena Fonseca – Sócia e CEO de ACE Cortex |

Nos últimos anos, temos testemunhado uma grande mudança no comportamento do consumidor. O que antes era um mercado dominado por produtos generalistas e estratégias de massificação, agora se tornou um campo de oportunidades para marcas que conseguem se conectar de forma autêntica e profunda com nichos de mercado altamente segmentados.

Se antes a estratégia das grandes empresas era crescer de forma ampla e atender “todo mundo”, hoje a lógica mudou: as marcas querem falar diretamente com consumidores que compartilham valores e necessidades específicas. A conexão emocional e a proposta de valor são os grandes diferenciais na construção de impérios dentro de nichos.

Um excelente exemplo dessa nova abordagem é a Patagonia. A empresa, que tem como pilares a sustentabilidade e um estilo de vida ativo, se consolidou como referência no mercado ao criar produtos voltados para consumidores que valorizam a responsabilidade ambiental. Para reforçar ainda mais sua identidade, a marca lançou um programa de segunda mão, incentivando seus clientes a revenderem roupas usadas da marca em vez de descartar ou comprar novas. Esse modelo fortalece o engajamento com seu público e reforça seu posicionamento autêntico.

Diante desse cenário, é natural que grandes empresas que antes apostavam em uma estratégia de massificação estejam reformulando seu modelo de negócio para atender segmentos mais nichados e exigentes.

Por que as grandes marcas estão apostando na segmentação de mercado?

A segmentação de mercado permite que as empresas identifiquem e atendam necessidades específicas de diferentes grupos de consumidores, aumentando a eficácia de suas estratégias de marketing.

Ao direcionar produtos e campanhas para públicos-alvo bem definidos, as marcas conseguem otimizar seus recursos e obter melhores resultados. Por exemplo, a Nivea realizou um estudo detalhado para compreender como diferentes grupos se comportavam em relação à exposição solar. Com base nessas informações, a empresa reformulou sua comunicação e aprimorou seus produtos para atender melhor cada segmento.

O objetivo das empresas ao adotarem essa estratégia é claro: evitar perda de mercado em um cenário onde a fidelização dos clientes está cada vez mais desafiadora, ao mesmo tempo em que ganham profundidade, relevância e capturam um público segmentado que busca soluções personalizadas.

Seja por meio da hiperpersonalização de produtos, pela compra de marcas que já conquistaram um nicho, ou até mesmo pela criação de novos negócios, as grandes marcas estão moldando o futuro de forma cada vez mais segmentada e assertiva.

Como as aquisições estratégicas aceleram o crescimento?

Nos últimos anos, temos visto uma movimentação cada vez mais estratégica no mercado, onde duas abordagens se destacam:

• Spin-offs, onde uma empresa cria um novo negócio para explorar um nicho promissor;
• Fusões e aquisições estratégicas (M&As), que permitem expandir rapidamente a atuação em segmentos de alto crescimento.

As aquisições estratégicas têm sido um dos caminhos mais eficientes para as empresas ampliarem sua presença em novos mercados ou fortalecerem sua posição em segmentos existentes. Em vez de criar uma nova marca do zero, grandes empresas adquirem negócios que já possuem expertise, base de clientes e produtos consolidados dentro do nicho desejado.

Um excelente exemplo é a aquisição da Whole Foods pela Amazon. Com essa aquisição, a Amazon conseguiu entrar rapidamente no mercado de alimentos orgânicos e naturais, utilizando a reputação e a base de clientes da Whole Foods para expandir sua atuação nesse nicho.

Outro exemplo é a L’Oréal, que adquiriu a SkinCeuticals para fortalecer sua presença no mercado de dermocosméticos, aproveitando a credibilidade da marca já consolidada entre dermatologistas e consumidores.

Esses movimentos permitem que grandes marcas agilizem seu crescimento, minimizem riscos e aproveitem a força de um nicho consolidado, ao invés de iniciar um novo mercado do zero.

Casos de Sucesso: Grandes Marcas e Seus Nichos

L’Oréal e SkinCeuticals: o poder da especialização

Um dos exemplos mais claros de como uma grande empresa pode se aprofundar em um nicho foi a aquisição da SkinCeuticals pela L’Oréal. A gigante francesa já dominava o mercado de beleza e cosméticos, mas percebeu que os consumidores estavam cada vez mais atentos à dermatologia e à eficácia científica dos produtos para skincare.

Em vez de desenvolver uma nova marca do zero, a L’Oréal optou pela aquisição da SkinCeuticals e a posicionou dentro do seu portfólio como uma linha premium e dermatologicamente avançada. Isso permitiu que a empresa atendesse tanto o consumidor comum quanto os profissionais de estética e dermatologistas, criando um ecossistema poderoso dentro do segmento de cuidados com a pele.

Lição: Marcas que se especializam e entregam um valor altamente técnico ganham credibilidade e fidelização – um ponto-chave em mercados cada vez mais educados.

Unilever e a expansão no mercado de cabelos texturizados

Outra empresa que entendeu a importância de nichar sua atuação foi a Unilever, que nos últimos anos tem feito movimentos estratégicos dentro do mercado de cabelos texturizados. A demanda por produtos específicos para cabelos crespos e cacheados tem crescido exponencialmente, e a Unilever percebeu que precisava ter marcas especializadas para capturar esse público de forma autêntica.

Foi assim que a empresa adquiriu marcas como SheaMoisture e Carol’s Daughter, que já tinham forte conexão com a comunidade negra e com o movimento de valorização da beleza natural. Em vez de tentar criar produtos genéricos dentro das suas linhas tradicionais, a Unilever investiu em marcas que já tinham identidade e pertencimento dentro do nicho.

Lição: Nichar não significa apenas atender um mercado menor – significa criar um diálogo real com consumidores que exigem autenticidade e representatividade.

Spin-Offs: o poder de usar suas vantagens competitivas para desenvolver e escalar novos negócios

Empresas estabelecidas também estão criando spin-offs para explorar novos segmentos de mercado e atender a demandas específicas dos consumidores. Um exemplo é o Grupo Boticário, que lançou marcas como Eudora e Quem Disse, Berenice?, focadas em diferentes públicos e necessidades dentro do mercado de beleza. Essas iniciativas permitiram ao grupo diversificar seu portfólio e alcançar novos consumidores com propostas de valor distintas. Alguns podem se questionar: Por que criar novas marcas dentro do mesmo segmento? Mas olhar para as necessidades específicas de cada consumidor não apenas pode personalizar toda a estratégia de comunicação, mas também abrir espaço para posicionamentos mais premium e com maiores margens e valor agregado.

Para se ter uma ideia, antes da criação das novas marcas, o Grupo Boticário apresentava um desempenho financeiro sólido, porém mais modesto em comparação aos resultados alcançados após a diversificação de seu portfólio. Em 2009, o faturamento da empresa foi de R$ 1,25 bilhão. Enquanto, em 2023, o Grupo Boticário chegou a registrar faturamento de R$ 30,8 bilhões, o que representa um crescimento de 30,5% em relação ao ano anterior. Esses resultados evidenciam o sucesso da estratégia de diversificação pois, apenas com seu core business não teria alcançado crescimento tão ascendente. 

Lição: Além de maior conexão com o consumidor final – a estratégia de ser uma house of brands, ou holding de negócios segmentados, pode apoiar no crescimento e a rentabilidade do negócio por criar posicionamento mais premium. 

Estratégias para criar um império em um nicho de mercado

Para se consolidar em um nicho de mercado, não basta apenas identificar uma oportunidade – é essencial estruturar uma estratégia robusta que garanta diferenciação e crescimento sustentável. Grandes marcas que dominam nichos seguem três pilares fundamentais: pesquisa de mercado, branding forte e construção de comunidades.

Pesquisa de mercado e identificação de oportunidades

A base de um império em um nicho de mercado começa com um entendimento profundo dos consumidores. Empresas bem-sucedidas utilizam análises detalhadas de comportamento, consumo e tendências para antecipar demandas e oferecer soluções sob medida.

Casos de sucesso:

• Fenty Beauty, de Rihanna, revolucionou a indústria de cosméticos ao perceber que muitas mulheres não encontravam tons de base adequados para suas peles. O lançamento da linha com 40 tons impactou o mercado e obrigou concorrentes a repensarem suas ofertas.

Lição: O verdadeiro diferencial de um nicho está em atender dores específicas do consumidor antes que os concorrentes percebam a oportunidade.

Branding forte e diferenciação competitiva

Um nicho não é construído apenas pelo produto ou serviço oferecido, mas pelo que a marca representa. Empresas que se destacam criam identidade forte, propósito claro e diferenciação significativa.

Casos de sucesso:

• Glossier começou como um blog de beleza e transformou-se em uma das marcas mais influentes do setor, apostando no minimalismo e na conexão direta com sua audiência digital.

Lição: Branding é mais do que um logotipo; é a experiência e o significado que a marca transmite ao consumidor.

Construção de comunidades e fidelização do público

Uma marca nichada precisa criar um ecossistema onde os consumidores se sintam parte de algo maior. A construção de comunidades fortalece a lealdade e transforma clientes em defensores da marca.

 Casos de sucesso:

• Peloton, empresa de equipamentos fitness, transformou um produto (bicicletas ergométricas) em um movimento social, com aulas interativas e uma forte conexão entre os usuários.

Lição: Criar um império em um nicho exige envolvimento genuíno com os consumidores, transformando-os em parte ativa do crescimento da marca.

Tendências e oportunidades de novos nichos

A segmentação de mercado não é apenas uma estratégia para o presente – ela é o futuro do consumo. Novos comportamentos, avanços tecnológicos e mudanças nos valores da sociedade estão abrindo espaço para nichos altamente lucrativos. Três grandes movimentos têm moldado essa nova era: sustentabilidade e ESG, personalização extrema com inteligência artificial e modelos de assinatura.

Crescimento do mercado de sustentabilidade e ESG

O consumo consciente deixou de ser uma tendência passageira e se tornou uma exigência para muitas pessoas. As novas gerações, especialmente Millennials e Gen Z, priorizam marcas alinhadas a valores de responsabilidade ambiental, social e de governança (ESG). Empresas que se destacam nesse setor estão construindo modelos de negócio sustentáveis, inovadores e lucrativos.

Casos de sucesso:

• Patagonia, além de investir em materiais recicláveis, lançou o programa Worn Wear, incentivando a revenda de roupas usadas da própria marca e reforçando seu compromisso com a economia circular.

Oportunidade: Empresas que conseguirem unir impacto positivo e rentabilidade terão uma vantagem competitiva expressiva nos próximos anos.

Personalização extrema com inteligência artificial

A personalização está elevando a experiência do consumidor a um novo patamar. Com o uso de inteligência artificial (IA) e big data, empresas conseguem criar ofertas ultra customizadas, atendendo desejos individuais de maneira mais eficiente do que nunca.Empresas que investem nesse modelo conseguem transformar consumidores em verdadeiros embaixadores de suas marcas.

Na indústria da beleza, a Sephora transformou a experiência do consumidor com ferramentas como o “Sephora Virtual Artist”, que permite testar maquiagens digitalmente antes da compra. Além disso, o programa de fidelidade da marca oferece recomendações personalizadas com base no histórico de compras e preferências, trazendo níveis de pontuações para os clientes alcançarem benefícios como descontos ou ganho de miniaturas.

Ao compreender profundamente o que move seu público, as marcas criam estratégias cada vez mais assertivas e lucrativas.

Oportunidade: O consumidor moderno deseja sentir que os produtos e serviços são feitos sob medida para ele. Marcas que adotarem IA para hiperpersonalização conquistarão lealdade e diferenciação.

O Avanço dos produtos e serviços baseados em assinaturas

O modelo de assinatura tem crescido exponencialmente, transformando setores inteiros ao substituir compras pontuais por recorrência mensal. Esse modelo não apenas aumenta a previsibilidade de receita, mas também fortalece o relacionamento entre marca e consumidor.

Casos de sucesso:

• Dollar Shave Club revolucionou o mercado de lâminas de barbear com um modelo de assinatura acessível e entrega direta ao consumidor.

Oportunidade: Qualquer setor pode explorar o modelo de assinatura – desde produtos de beleza e moda até educação e saúde. Empresas que conseguirem criar valor contínuo para seus assinantes terão vantagem competitiva no longo prazo.

Quais são os benefícios dos spin-offs para empresas consolidadas?

À medida que grandes empresas buscam inovação e crescimento sustentável, os spin-offs se tornam uma estratégia poderosa para explorar novos mercados sem comprometer suas operações principais. Esse modelo permite que uma empresa-mãe crie uma nova entidade autônoma para testar abordagens inovadoras, acelerar o desenvolvimento de produtos e atender nichos de forma mais eficaz.

1. Autonomia e agilidade para Inovar

Spin-offs operam com maior flexibilidade do que suas empresas-mãe, permitindo uma cultura de experimentação e rápida adaptação ao mercado. Enquanto grandes corporações frequentemente enfrentam barreiras burocráticas, os spin-offs podem testar novos produtos e estratégias sem os entraves da estrutura organizacional tradicional.

2. Expansão para novos nichos sem risco para a marca principal

Criar spin-offs permite que empresas explorem segmentos de mercado sem diluir o posicionamento da marca principal. Ao invés de lançar uma nova linha de produtos sob um nome já consolidado, a empresa pode estruturar um novo negócio, com identidade própria, voltado para um público específico.

3. Geração de valor para acionistas e maior rentabilidade

Muitas empresas utilizam spin-offs como estratégia de valorização. Quando um spin-off ganha tração no mercado, ele pode ser vendido, incorporado novamente ou até aberto para IPO, gerando retorno financeiro expressivo para a empresa-mãe e seus acionistas.

Quais são os benefícios dos M&As para empresas consolidadas?

Além dos spin-offs, uma outra estratégia amplamente utilizada por empresas consolidadas para crescimento acelerado e diversificação é a de fusões e aquisições (M&As – Mergers & Acquisitions). Esse movimento permite que companhias aumentem sua participação de mercado, adquiram novas tecnologias e entrem em segmentos estratégicos sem precisar construir tudo do zero.

1. Aceleração da expansão para novos mercados

Aquisições estratégicas permitem que uma empresa entre em um novo mercado de forma mais rápida e eficiente do que se tivesse que desenvolver um negócio do zero. Em vez de construir infraestrutura, contratar equipes e criar reconhecimento de marca, a empresa-mãe pode absorver uma companhia já consolidada no setor desejado.

2. Acesso a novas tecnologias e capacidades

M&As são uma excelente forma de incorporar tecnologia e expertise sem precisar desenvolver internamente. Empresas inovadoras menores muitas vezes possuem produtos revolucionários, mas enfrentam dificuldades para escalar. Ao serem adquiridas por uma grande corporação, conseguem expandir suas operações rapidamente.

3. Diversificação e redução de riscos

Empresas que operam em mercados voláteis utilizam M&As como forma de diversificar suas fontes de receita e reduzir dependência de um único setor. Essa estratégia protege a companhia contra crises e flutuações inesperadas na economia.

4. Aumento de sinergias e eficiência operacional

M&As possibilitam sinergias operacionais, onde duas empresas combinam suas forças para operar com mais eficiência e reduzir custos. A fusão pode resultar em melhorias logísticas, maior poder de negociação com fornecedores e eliminação de redundâncias.

5. Aumento do valor para acionistas

Fusões e aquisições bem planejadas aumentam o valor de mercado das empresas envolvidas. Ao integrar um novo negócio ao seu portfólio, uma empresa pode elevar sua receita, melhorar suas margens e entregar melhores retornos para seus acionistas.

Spin-offs vs. Fusões & Aquisições: qual a melhor estratégia?

• Spin-offs são ideais para empresas que desejam explorar um nicho com mais autonomia e flexibilidade, sem comprometer sua identidade principal.
• Fusões e Aquisições são estratégias eficazes para crescimento rápido, diversificação e inovação tecnológica, aproveitando negócios já estabelecidos.

Tanto os spin-offs quanto as M&As têm um papel estratégico fundamental no crescimento e na adaptação das grandes empresas a um mercado cada vez mais dinâmico.

Para se aprofundar nesses temas, confira no site da ACE Cortex:

• Spin-offs e Aquisições: estratégias que redefinem o crescimento dos negócios
• A mudança nos hábitos de consumo está redefinindo o mercado: como adaptar sua estratégia

O que podemos aprender com esses movimentos?

Esses casos mostram que o futuro do mercado não está apenas no crescimento, mas no crescimento inteligente. As empresas que conseguirem entender as demandas dos nichos, se especializar e entregar soluções que vão além do óbvio terão mais chances de construir marcas fortes, com forte valor de mercado e lucratividade.

• Não basta criar produtos para todo mundo. O segredo é falar com o público certo, do jeito certo.
• Spin-offs e M&As estratégicos permitem entrar em mercados com credibilidade, aproveitando marcas que já possuem relevância.
• Autenticidade e pertencimento são fatores cada vez mais decisivos na escolha de marcas e produtos.

Se você lidera uma empresa, a pergunta que fica é: onde está a sua oportunidade de nicho? Como você pode se especializar e criar um diferencial real para o seu público?

Sobre Milena Fonseca – CEO & Sócia na ACE Cortex

Executiva competente para conceber estratégias de transformação digital, impulsionar novos negócios desde a idealização à escala e estruturar operações centradas na excelência empresarial, com mais de 6 anos de experiência em Saúde, Inovação e Consultoria.